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Gênero e Sexualidade na Escola - Aspectos legais e teóricos de sua fundamentação

Comentários sobre a legislação pertinente e teorias educacionais que embasam a metodologia de ensino sobre Gênero e Sexualidade nas escolas - o combate ao Bulliyng

O estado brasileiro, definido como democrático em sua constituição, ainda coloca padrões para o reconhecimento dos direitos de cidadãs e cidadãos. O artigo 5º da Constituição Federal diz:

Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade […]”. (BRASIL, 2012, n.p.).

A escola deve refletir o Estado definido pela Constituição. O sistema educacional, como um todo, deve respeito à Carta Magna e por essa orientação constitucional, o combate a preconceitos das mais variadas naturezas não somente é desejável, mas deve ser feitopela escola, pública ou privada, em todos os seus níveis, especialmente a partir do Ensino Fundamental, levando em conta que a escola não deve somente preparar futuros profissionais, mas, em uma visão mais ampliada, capacitar cidadãos para lidar com as chamadas diferenças, reconhecendo-as como respeitáveis e normais.

Para Althusser (1985), a escola é um aparelho ideológico do Estado. Por isso, caracteriza-se como uma instância situada em posição privilegiada na sociedade para que se exerça o combate a preconceitos e discriminações e assim o faz as políticas públicas do Governo do Estado de São Paulo. Por isto, na escola, em concordância com a Constituição, todos devem ser tratados “sem distinção de qualquer natureza” e assim alunas e alunos devem igualmente serem ensinados a fazê-lo.

Em função disto, faço a seguinte observação em minha dissertação de mestrado:

[...] sem uma consciência democrática e sem uma ética republicana, o que passa pelo reconhecimento consciente dos direitos de todos os sujeitos na perspectiva de um Estado laico, não será possível trabalhar seriamente os temas da diversidade de expressão da sexualidade e da identidade de gênero no meio escolar. Essa tomada de posição por parte do corpo docente é uma postura a favor da cidadania: é uma escolha política, a de trabalhar em prol da igualdade de direitos entre todos os cidadãos. A ideologia presente nesse caso, que no Brasil é constitucional e que deve ser abertamente assumida, é a da promoção democrática e republicana. (CAROLLI, 2017, p. 84).

E alego sobre a responsabilidade profissional docente:

O profissional de educação que se omite frente à realidade das discriminações de pessoas quanto à diversidade de expressão da sexualidade e da identidade de gênero acaba por permitir a manutenção dessas atitudes no âmbito maior da sociedade, haja vista que esse aprendizado discriminatório dá-se mediante a reprodução livre desses discursos discriminatórios na sociedade e no próprio ambiente escolar; essa situação, que se encontra especialmente no Currículo Oculto (SILVA, 1999, p. 78), mas também é refletida no Currículo Oficial, é cultural, adentra a instituição de ensino e atua incessantemente. (CAROLLI, 2017, p. 85).

Corrobora esta visão o trabalho da pesquisadora Guacira Lopes Louro: que afirma, por exemplo, sobre o preconceito da homofobia, dizendo que:

Consentida e ensinada na escola, a homofobia expressa-se pelo desprezo, pelo afastamento, pela imposição do ridículo. Como se a homossexualidade fosse "contagiosa", cria-se uma grande resistência em demonstrar simpatia para com sujeitos homossexuais: a aproximação pode ser interpretada como uma adesão a tal prática ou identidade. [...].” (LOURO, 2000, p. 19).


Assim, para que se tenha um ensino integral, com vistas à formação da cidadania, a liberdade quanto aos conteúdos a serem ministrados é necessária ao bom desenvolvimento do processo de ensino. Essa liberdade é protegida constitucionalmente. Assim, para que se tenha um ensino integral, com vistas à formação da cidadania, a liberdade quanto aos conteúdos a serem ministrados é necessária ao bom desenvolvimento do processo de ensino. Essa liberdade é protegida constitucionalmente.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: 7 [...]; II –liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; […]. (BRASIL, 2012, n.p.).

Destaca-se, especialmente, a menção constitucional quanto à liberdade de divulgar o pensamento; a liberdade é necessária para que seja dado acesso a alunas e alunos ao que existe de atualizado na bibliografia científica e educacional contemporânea.

Por sua vez, a Resolução do Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Educação, nº 4, de 13 de Julho de 2010 diz:

[…] Art. 4º As bases que dão sustentação ao projeto nacional de educação responsabilizam o poder público, a família, a sociedade e a escola pela garantia a todos os educandos de um ensino ministrado de acordo com os princípios de: I - igualdade de condições para o acesso, inclusão, permanência e sucesso na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; IV - respeito à liberdade e aos direitos; […].

Por isso não cabe qualquer censura à educação. Pelo contrário, lê-se nas orientações para professores fornecidas pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, em seu Curso de Formação de Professores Ingressantes:

Uma das contribuições da escola é construir uma pedagogia multicultural que respeite as diferenças e não reproduza estereótipos, exclusões e padrões sociais incompatíveis com o respeito à diferença e à diversidade. Entre outras ações, ela pode: ajudar na tomada de consciência para acabar com o preconceito e a discriminação; colaborar em políticas públicas para o respeito à diversidade; avançar continuamente para uma escola verdadeiramente inclusiva. As práticas educativas na escola, dentro e fora da sala de aula, devem se sustentar no princípio de respeito às diferenças e acolhimento da diversidade. É preciso considerar que os alunos trazem para a sala de aula um conjunto de representações sociais e os professores precisam saber lidar com tais representações, favorecendo a ligação entre o Currículo e a cultura dos estudantes, de modo que eles adquiram competências para interpretar a realidade e nela intervir.Isso implica que os professores desenvolvam situações de ensino quepossibilitem aos alunos desmistificar e ressignificar o senso comum e combater valores e comportamentos discriminatórios,excludentes e antidemocráticos. (Curso de Formação de Professores - 3.3.1.1 - A função social da escola).

Especificamente sobre os efeitos da cultura da homofobia que é reproduzida pelo Currículo Oculto dentro da escola e perpetuado em nossa sociedade, destaco:

A aversão a pessoas homossexuais, chamada homofobia, desencadeia diversas formas de violência física, verbal e simbólica contra estas pessoas. No Brasil são freqüentes os homicídios, sobretudo de travestis. Há também o suicídio de muitos adolescentes que se descobrem gays, e mesmo de adultos. Eles chegam a esta atitude extrema por pressentirem a rejeição hostil da própria família e da sociedade. Há pais que já disseram: “prefiro um filho morto que um filho gay”. Esta hostilidade gera inúmeras formas de discriminação, e, mesmo que não leve à morte, traz frequentemente tristeza profunda ou depressão. (LIMA, 2009, n.p.).

Assim, esse discurso presente no senso comum e que adentra a escola, sendo reproduzido no convívio social dos alunos, bem como outros tipos de discriminação aguardam por intervenções pedagógicas capazes de barrar a sua reprodução no âmbito maior da sociedade. A cultura da discriminação está alicerçada em uma pseudo hierarquia de sexualidades, que por sua vez apoia-se em tradições mal compreendidas e em práticas de exclusão nunca questionadas. Sobre estes conceitos se estabelece um discurso de ódio, que pretende combater o que se considera como um inimigo:

O discurso de ódio constitui, assim, também uma forma de violência contra as minorias em questão, pois reproduz o heterossexismo – uma ideologia alicerçada na hierarquia das sexualidades, contribuindo de forma decisiva para aumento da hostilidade frente a gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e travestis. Ademais, resulta na internalização de preconceitos e estereótipos por parte das próprias vítimas, trazendo uma série de consequências nefastas à sua autoestima. É esse discurso que, encontrando eco no âmbito de instituições como a família, a escola e a mídia, alimenta uma ordem social de exclusão e constrói a ideologia que se encontra por trás da permanente violação de direitos de indivíduos LGBT. (OLIVA, 2014, p. 11).

Finalizo essa exposição sobre essa demanda urgente a ser atendida pela escola, citando um último trecho de minha dissertação:

Os discursos presentes em nossa na cultura são estimuladores das mais variadas formas de violência contra pessoas LGBT; muitas vezes seus autores justificam-se nesses discursos, citando-os, especialmente referenciando-se no discurso religioso. Devido ao fato de a manifestação da violência em sua forma física ser um fenômeno de base cultural, a resolução desse problema passa, inevitavelmente, por uma educação questionadora, livre e com seus promotores amplamente conscientes de sua responsabilidade social e igualmente conscientes dos mecanismos de reprodução cultural em ambiente escolar. Isso faz da educação uma atividade inevitavelmente política, de resistência ao discurso da violência, bem como a outros discursos nocivos à manutenção de uma sociedade democrática de convivência pacífica e civilizada. (CAROLLI, 2017, P. 84).

Assim, o professor consciente de sua missão social deve estar preparado para expor os mecanismos que levam à discriminação e a violência, no intuito de tornar compreensível a alunas e alunos não somente a importância da convivência pacífica, mas também de tornar compreensível os motivos pelos quais deve-se reconhecer a alteridade como igual em direito à vida.

Esse trabalho somente pode ser realizado com o diálogo pertinente entre a Educação, a Religião e a Ciência que, quanto à escola, necessariamente, passa pela formação de qualidade e pela atualização contínua da formação de professoras e professores, de todos os níveis educacionais.

A.L.Carolli - Cidadania e Reflexão - 2018

Referências

ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de estado: Nota sobre os aparelhos ideológicos de estado. 3 ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985.

AUSUBEL, D. P. A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982

BAGEMIHL, Bruce. Biological Exuberance: Animal Homosexuality and Natural Diversity. New York: St Martin s Press, 1999.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 35 ed. Brasília: Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados, 2012.

CAROLLI, André Luís. Desconstrução de discursos discriminatórios sobre a diversidade de expressão da sexualidade e da identidade de gênero expressos entre alunos e alunas do ensino médio. Dissertação de Mestrado em Educação, 199 p., sob orientação da Profa. Dra. Maria José de Jesus Alves Cordeiro - UEMS. Paranaíba, MS: UEMS, 2017.  Para fazer o download da dissertação completa: clique aqui!

CONSELHO, Nacional de Educação. Resolução nº 4, de 13 de Julho de 2010.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 25 ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1996.

LIMA, Luís Corrêa. Homofobia, um pecado.Jornal do Brasil. Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, 23 de setembro de 2009.

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1997.

OLIVA, Thiago Dias. O discurso de ódio contra as minorias sexuais e os limites da liberdade de expressão no Brasil. Dissertação (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. São Paulo: USP, 2014.

SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO (Curso de Formação de Professores - 3.3.1.1 - A função social da escola).

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